quinta-feira, 20 de junho de 2013

Órfã aos 33. Minha mãe

Depois da morte do meu avô, parecia que ia levar muito tempo para perdermos mais alguém, até porque, ele morreu bem novo, acho que não tinha 65 ainda. Quando eu fiz 29 anos, foi a vez da minha mãe.
Eu e minha mãe não tínhamos a melhor relação do mundo. Ela era um ídolo caído na minha vida, a pessoa que durante toda a minha infância e adolescência eu queria ser e que, depois de largar meu pai, passou a me decepcionar diariamente.
E não pensem que isso tem alguma coisa a ver com o fato de ela ter ido embora de casa não (sim, ela foi embora viver com outra pessoa, no meio da confusão da morte do meu avô e nós ficamos com o meu pai). O que me causou tanto desgosto em relação a ela foi perceber que a imagem de super mulher que eu tanto admirava não passava de fachada. Anos de brigas e terapias para eu perceber que minha mãe era uma mulher egoísta, egocêntrica e fraca. E que eu não gostava dela como pessoa.
Pode parecer cruel falar assim de alguém que já se foi. Mas ela foi a responsável por quase todos os meus demônios, e ainda hoje ecoa de vez em quando, e eu acho mais do que justo expurgar o que for necessário em prol de mim mesma, para variar. Minha mãe, como toda leonina, achava que era o sol do mundo. E que o mundo todo tinha vindo para servi-la. Ela genuinamente não entendia porque as coisas não eram dessa forma, porque as pessoas se afastavam, porque elas "sumiam". Chamo isso de "complexo de Michael Jackson". Sabe aquela coisa de acreditar tanto na própria mentira que a pessoa já nem acha mais que está mentindo? Então. Minha mãe era assim.
Não era uma pessoa má. Pelo menos jamais vou acreditar que ela maltratava as pessoas deliberadamente. Prefiro pensar que era loucura mesmo. Um sentimento de "o mundo me deve" que eu não faço ideia de onde ela tirou. E aí as coisas não se encaixaram. Ainda assim, uns dois ou três anos antes da morte dela, quando o marido dela veio nos contar que haviam descoberto um câncer, eu chorei. Fiquei bem assustada. Tive medo de perdê-la.
Esse primeiro câncer foi descoberto bem no início e foi tratado. Mais um monte de dificuldades porque, na ilusão dela, eu deveria naquele momento ter parado tudo para cuidar dela. Não funcionava assim, ela nunca havia cuidado de mim, e essas coisas acabam por definir os relacionamentos. Depois da cirurgia para a retirada do tumor ela foi à feira, contra ordens médicas, e quebrou o pé em vários lugares. Mais uma fase de tormento, dois meses sem poder colocar o pé no chão.
O segundo câncer foi descoberto uns dois anos depois. E ela começou tudo de novo. Quimio, rádio, cirurgias. Mas minha mãe sempre se recuperou tão bem de tudo que jamais imaginávamos que alguma coisa definitiva fosse acontecer. Foram alguns meses de tratamento nos quais minha mãe se suavizou. Parece que algo dizia a ela que o tempo dela na terra estava escasso. Convivemos muito eu e ela. Fizemos muitas coisas juntas. Quando minha mãe não dava uma de Edna (esse é o nome dela), eu não tinha ressalvas. Foi um período muito bom no qual ela não tentou me usar, nem me cobrar de coisas absurdas.
Logo que me mudei para Curitiba, ela passou pela última cirurgia, e alguma coisa deu errado. Foram dois meses de UTI, de altos e baixos, de idas e vindas. E, ironicamente, ela tinha sido um dos principais motivos para eu me mudar para longe de casa. No dia 18 de janeiro de 2008 minha mãe faleceu.

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